Estava pensando em você hoje
logo após chegar da feira com minha mãe.
Pensei o quanto queria que
você estivesse ali no lugar dela. Só pra que eu tivesse a liberdade de comer quantos
pasteis eu quisesse sem ser repreendida e ridicularizada.
Pensei que se eu pudesse ter
você ao meu lado naquela barraca de pastel eu me sentiria aceita como eu sou e
nas coisas como eu gosto de fazer.
Seria compreendida em meu desejo de comer o
quanto eu aguentar por amar o sabor dos alimentos e gostar de prolongar esse
sabor o máximo possível.
Pensei que se você estivesse
naquele momento junto a mim, eu poderia compartilhar minha ansiedade, olhando a comida sendo preparada pra mim e da minha alegria quando ela chega em
minhas mãos e do bem estar que sinto ao leva-la a boca e sentir seu gosto.
Mas ao contrário disso, eu
preciso sufocar essa alegria de comer livre o quanto eu quiser até me sentir
saciada. Porque vejo os olhares me reparando, me recriminando por comer sempre mais
que a maioria como se eu tivesse fazendo algo ruim a eles.
Minha mãe disse: “ que coisa
mais feia” – Senti a voz dela de contrariedade e desapontamento, com uma
expressão fechada e testa franzida, como se eu tivesse feito algo muito errado ao pedir o terceiro pastel pra comer porque estava muito gostoso e não queria
parar de sentir aquele sabor delicioso. Mas mesmo ficando chateada por ela ter
feito isso, não neguei quando ela pediu o terceiro pastel aborrecidamente. Quando ela me passou o salgado, praticamente empurrando pras minhas mãos, disse: “ quer
comer até explodir? Então come! Já está gorda e vai ficar mais feia ainda”.
Mesmo assim eu comi! Mas o
sabor não foi mais o mesmo. Estava azedo e entalava quando eu engolia. Era o
sabor da culpa eu acho. Senti que me encolhi pra comer, enquanto sentia que
todos naquela feira me olhavam, reparando em mim e horrorizados, me
recriminavam. Minha mãe me fez comer o pior pastel da minha vida.
E quando chegamos em casa,
ela me disse: “ sabe que não vai almoçar, não é? Ninguém mandou encher a
barriga de pastel! Sabe que quando for namorar, ninguém vai te querer, sua
gorda!”
Olhei pra ela com os olhos
baixos, sentindo uma dor no peito e não falei nada. Fui pra cozinha
ajeitar as frutas e legumes que compramos, e fui cortar as verduras para o
almoço me sentindo humilhada. Mas antes de terminar minhas tarefas, comi duas
bananas e joguei as cascas pro quintal do vizinho pra ela não ver. Pensei que
ela não deveria humilhar assim uma filha e que não tinha o direito de me
proibir de almoçar, só porque comi mais do que devia na feira. Mas ela é minha
mãe, e eu só tenho quatorze anos! Ah...tá bom , vai! Treze! Mas faltam só sete
meses pra eu completar os quatorze.
Sabe, eu só queria comer em
paz e não me sentir culpada por estar fazendo algo de errado. Sem que alguém me
olhe com reprovação e desapontamento dizendo que ficarei feia, serei
desprezada.
Você me desprezaria? Me
amaria mesmo se eu engordasse por gostar de comer muito? Me acharia feia? Penso
que não quero viver sozinha sem namorado. Quero o que todas as meninas querem;
arrumar um gatinho pra nos levar ao cinema, ao shopping, pra passear de mãos
dadas e que me ache bonita e me valorize, que goste de mim.
Mas você é o menino dos meus
sonhos! E sim! Me amaria! Ainda que eu
engordasse um pouco me amaria. Ainda que eu fosse comilona, você teria alegria
de me ver tendo alegria com uma das minhas maiores felicidades que é comer um
bom prato, uma guloseima. Comer sem sentir qualquer gosto azedo de culpa e só o
sabor doce da liberdade e prazer.
Porém penso que se eu for
livre, eu engordaria muito e perderia a forma que todos querem de mim. E mesmo
assim, será que você ainda ia me querer? Sentiria vergonha de mim? Me
apresentaria a seus pais e amigos?
Mas você é o garoto dos meus
sonhos! E sim! Você iria continuar querendo minha presença, meu corpo e
sentiria orgulho de me apresentar a todos a sua volta. Teria prazer em ver meu
corpo crescendo por eu estar tendo tantas alegrias de comer bem e com gosto de
satisfação. Você teria prazer com o meu prazer. Minha alegria seria a sua alegria.
Na verdade, você é o rapaz
dos meus sonhos! E me traria coisas deliciosas todas as vezes que fosse vir pra
me buscar pra sairmos juntos. Se interessaria em saber tudo o que eu mais amo no
mundo todo e me serviria de tudo isso, pelo simples prazer de me ver comer
contente e sorrindo. Você não me culpa ou me censura por comer além da conta,
porque você me conhece e sabe de todas as coisas que me faz feliz. Só você tem
a chave pra me libertar. Eu poderia ser livre com você!
Penso em você cozinhando pra
mim, me dando comida entre carinhos e beijos, compartilhando de todo o prazer
que esses momentos poderia me dar.
Sabe, tem dias como hoje que
eu sonho muito com você. E queria ter a capacidade de te criar e trazer você
pro mundo real. Mas sei que você não existe. E não posso me enganar. Sei que
minha mãe está certa. Minhas amigas da escola estão certas. Ninguém quer uma
gorda. Os meninos teriam vergonha de mim. Ninguém ia querer ir comigo ao
cinema, nem a praça pra não ser visto com a gorda da escola pelos amigos e ser encarnado.
Mas sabe, também penso; por que as coisas tem que ser assim? Por que temos que
viver limitados por escolhas que nem fomos nós quem as fizemos?
Penso que só você é capaz de
me entender e me completar. E por isso você é o gatinho dos meus sonhos, onde
tudo é perfeito. Onde existe alma gêmea, onde existe amor além das aparências
que todos exigem, onde há liberdade de querer e gostar do que é diferente dos
outros sem que ninguém te censure por isso, nem te humilhe ou diminua.
Hoje quando eu for dormir,
vou pedir aos anjos pra sonhar com você e espero te encontrar nos meus sonhos!
Jaque Marques - 04/03/1991
Olá meus doces feedists! Jaque Marques é um personagem criado por mim, inspirada num outro personagem Renata Marques, que é protagonista de um livro que trabalho há algum tempo, mas que ainda não tive a inspiração pra termina-lo. A Jaque é a versão adolescente e junevil da Renata Marques que no livro já se apresenta madura com 34 anos.
Se forem repassar, por favor, informem a fonte! Espero que gostem!
bjo da Vênus!